Friday, January 14, 2011

A divisão do mundo e a velha ordem mundial

O Olimpo na Terra

Ialta, estrategicamente localizada numa pequena baía na península da Criméia, no Mar Negro, é uma pequena cidade cercada por montanhas, com muito sol e temperaturas amenas o ano inteiro. Lugar privilegiado pela natureza, onde se cultiva tabaco, uvas e frutas cítricas desde o século XII, quando venezianos e genoveses se instalaram na península, a Criméia passou de mãos em mãos no decorrer dos séculos até ser entregue à Ucrânia durante a era soviética, sendo hoje o segundo porto internacional daquele país a seguir a Odessa. Manuscritos de autores gregos contam que, entre os séculos X e III a. C., viveu na região um povo chamado Tauri, que se dedicava à pesca, agricultura e pecuária e também à pirataria em nome da deusa Deva, dedicando-lhe sacrifícios humanos. Um senhor feudal russo, de nome Fiodor, entregou a Criméia a um sultão turco, em 1475, tendo sido tomada de volta pela Rússia em 1783. Para escapar do rigoroso inverno moscovita, os czares russos escolheram o lugar como a sua residência de verão, uma tradição que foi mantida pelos líderes do PCUS. Com o poder soviético, virou o local de repouso por excelência dos russos, que passaram a construir sanatórios, termas e casas de descanso na península. No outono de 1941, foi ocupada pelos alemães no âmbito da segunda grande guerra, tendo sido libertada após sangrenta batalha em 16 de abril de 1944.

Região disputada por reis e piratas desde tempos remotos, não é de admirar que os líderes das três potências que estavam a derrotar os exércitos de Hitler tenham escolhido Ialta para, em fevereiro de 1945, fazer planos antecipados para a partilha do mundo. No palácio Livadia, mandado construir por Nicolau II, reuniram-se Franklin Roosevelt, presidente norte-americano, Winston Churchill, primeiro-ministro britânico, e o anfitrião Iussef Stálin, secretário-geral do Partido Comunista da União Soviética. Em cima da mesa, na agenda dos trabalhos da conferência, a divisão das zonas de influência da Europa e a criação de uma nova ordem internacional que viesse substituir a fracassada Sociedade das Nações*.

Quando os Aliados se reúnem em Ialta, entre 4 e 11 de fevereiro de 1945, a vitória contra os países do Eixo era já uma certeza. A Alemanha fora ocupada e não resistiria muito mais tempo. A Itália se rendera e o Japão ainda preocupava os Estados Unidos, que queriam neste encontro envolver a URSS na guerra contra o país do Sol Nascente. Como a política americana naqueles tempos era de não ingerência nos países europeus, Roosevelt deixou que Stálin silenciosamente colocasse a sua pata sobre a Europa do Leste, apesar das tentativas de Churchill de fazer pesar a balança para o outro lado, tentando incluir uma França em frangalhos no grupo dos países vencedores, com poder político-diplomático para dar cartadas na reconstrução do continente.

A questão central da partilha da Europa envolveu a Alemanha e Polônia. Decidiu-se que o território germânico seria dividido em três zonas de ocupação - o leste para a URSS, o sul para os EUA e o oeste para a Grã-Bretanha - e, no que toca à Polônia, Roosevelt e Churchill aceitaram um governo imposto por Moscou e recortaram o país de tal forma que ficou irreconhecível, cedendo um terço do território à URSS, incluindo cidades importantes como Vílnius, Brest e Lvov. Stálin e Roosevelt acordaram também a divisão dos despojos de guerra na vitória sobre o Japão. A URSS ganhou a posse das ilhas Sacalinas e Curilhas, que ainda hoje pertencem à Rússia, resultando num impasse diplomático que durou dezenas de anos, com a guerra sendo encerrada oficialmente quando Vladimir Putin visitou o Japão em (:XXXXX) e devolveu o arquipélago aos nipônicos.

Os grandes líderes acordaram também em Ialta realizar uma conferência, naquele mesmo ano, em São Francisco, nos Estados Unidos, para criar a Organização das Nações Unidas. Mais uma vez, Stálin adiantou-se no jogo de xadrez que iria redesenhar o mundo no pós-guerra conseguindo que a URSS tivesse direito a três assentos na Assembléia Geral da ONU, sendo representada pela Federação Russa, Ucrânia e Bielorússia. Durante a conferência, o premier inglês tentou a todo custo conter o crescimento da influência soviética na Europa, mas Stálin tinha na mão o trunfo de ter empurrado as tropas nazistas até território alemão e ter ocupado com o Exército Vermelho mais da metade do continente. Churchill sabia que o seu homólogo soviético planejava implantar na Europa de Leste regimes de orientação comunista, mas a Grã-Bretanha estava arruinada pela guerra e, se tinha ainda alguma influência política, era mais pelo peso do Império Britânico do que pelo seu mérito militar durante o conflito.

Na Conferência de São Francisco, em junho de 1954, representantes de 50 países redigiram a Carta das Nações Unidas, criando a organização em 24 de outubro de 1945 com o objetivo de manter a paz e a segurança internacionais, desenvolver a cooperação entre os povos, promover os direitos humanos e as liberdades fundamentais. Foi decidido também criar o Conselho de Segurança da ONU, ao qual teriam acesso somente as grandes potências, cinco delas com lugar permanente e seis com lugar não-permanente. Os países com assento permanente no Conselho de Segurança, os únicos que teriam direito a veto, eram os Estados Unidos, a União Soviética, a Grã-Bretanha, a China e a França.

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